Câmara Municipal de Jaraguá do Sul

Projeto de Lei Ordinária 162/2021
de 27/07/2021
Ementa

Dispõe sobre política pública municipal para garantia, proteção e ampliação dos direitos das pessoas com Transtorno do Espectro Autista (TEA) e seus familiares.

Texto

Art. 1º A política municipal para garantia, proteção e ampliação dos direitos das pessoas com Transtorno do Espectro Autista (TEA) e seus familiares fica disciplinada nos termos das diretrizes estabelecidas nesta Lei.

§ 1º Para os fins desta lei, considera-se pessoa com Transtorno do Espectro Autista (TEA) aquela que, em razão de neurodesenvolvimento atípico, apresente as seguintes características:

I - dificuldade de comunicação, podendo haver comprometimento da linguagem verbal e não verbal, literalidade, concretude, apraxia de fala e dislexia;

II - dificuldade de manutenção de interação social, ausência ou diminuição de reciprocidade e pouco ou nenhum apego a convenções sociais;

III - padrões restritivos e repetitivos de comportamentos, interesses, temas e atividades, apego à rotina e necessidade de planejamento;

IV - recebimento, processamento e resposta aos estímulos sensoriais de forma peculiar, podendo haver hiper ou hiporresponsividade dos sentidos e rigidez mental.

§ 2º As características elencadas no § 1º deste artigo podem se apresentar em diferentes graus, em conjunto ou de forma isolada.

§ 3º A Carteira de Identidade instituída pelo Decreto Federal nº 9.278, de 5 de fevereiro de 2018, que regulamenta a Lei Federal nº 7.116, de 29 de agosto de 1983 e pela Lei Municipal nº 7.819, de 07 de dezembro de 2018, configura documento válido para garantir o acesso às políticas municipais voltadas às pessoas com TEA e ao atendimento prioritário, podendo ser adicionado ao referido documento o símbolo da fita quebra-cabeça, símbolo mundial da conscientização do transtorno do espectro autista.

§ 4º As pessoas com Transtorno do Espectro Autista são equiparadas a pessoas com deficiência, para todos os efeitos legais, conforme Lei Federal nº 12.764, de 27 de dezembro de 2012, que estabelece a Política Nacional de Proteção dos Direitos da Pessoa com Transtorno do Espectro Autista, e Lei Municipal nº 7.819, de 07 de dezembro de 2018.

Art. 2º São diretrizes da Política Municipal para garantia, proteção e ampliação dos direitos das pessoas com Transtorno do Espectro Autista (TEA) e seus familiares:

I - a intersetorialidade no desenvolvimento das ações e das políticas e no atendimento à pessoa com Transtorno do Espectro Autista;

II - a participação da comunidade na formulação de políticas públicas voltadas às pessoas com Transtorno do Espectro Autista e o controle social da sua implantação, acompanhamento e avaliação;

III - o protagonismo da pessoa com Transtorno do Espectro Autista na formulação de políticas públicas voltadas à efetivação de seus direitos;

IV - a promoção, pelo Município de Jaraguá do Sul, de campanhas de esclarecimento sobre o Transtorno do Espectro Autista;

V - a atenção integral às necessidades de saúde da pessoa com Transtorno do Espectro Autista, objetivando o diagnóstico precoce, o atendimento multiprofissional e o acesso a medicamentos e alimentação adequada;

VI - o estímulo à inserção da pessoa com Transtorno do Espectro Autista no mercado de trabalho, observadas as peculiaridades da deficiência e a Lei Federal nº 8.069, de 13 de julho de 1990;

VII - o incentivo à formação e à capacitação de profissionais especializados no atendimento à pessoa com Transtorno do Espectro Autista, bem como a pais e responsáveis;

VIII - o apoio social, psicológico e formativo aos familiares de pessoas com TEA;

IX - a inserção da pessoa com Transtorno do Espectro Autista na sociedade, podendo o Município implementar políticas públicas para a garantia, proteção e ampliação de seus direitos;

X - a proteção contra qualquer forma de abuso e discriminação, sujeito às penalidades legais;

XI - a garantia, na rede pública municipal de ensino, de matrícula nas classes comuns e de oferta do Atendimento Educacional Especializado - AEE aos estudantes da Educação Especial, quando se fizer necessário, e após avaliação educacional especializada, amparadas pelo Plano de AEE.

Parágrafo único. A política tratada nesta Lei tem como objetivo promover a inclusão social, priorizando a autonomia, protagonismo e independência das pessoas com TEA, bem como dinamizar a gestão, promovendo a desburocratização e facilitando a criação de mecanismos que propiciem mais agilidade e efetividade na consecução dos processos de diagnóstico e de intervenção pedagógica, a fim de abarcar as articulações de ações e projetos voltados à população com TEA, a seus familiares e cuidadores.

Art. 3º Cabe ao Município assegurar à pessoa com Transtorno do Espectro Autista a efetivação dos direitos fundamentais referentes à vida, à saúde, à sexualidade, à alimentação, à habitação, à educação, à profissionalização, ao trabalho, ao diagnóstico e ao tratamento, ao transporte, à cultura, ao desporto, ao turismo, ao lazer, à informação, à comunicação, à dignidade, ao respeito, à liberdade, à convivência familiar e comunitária, entre outros, estabelecidos na Constituição Federal, na Lei Federal nº 12.764, de 2012, na Lei Federal nº 13.146, de 6 de julho de 2015, e outras normas que garantam seu bem-estar pessoal, social e econômico.

§ 1º Poderá ser criado cadastro municipal das pessoas com Transtorno do Espectro Autista, levando-se em conta intersecções de gênero e faixa etária, visando subsidiar a Política ora instituída.

§ 2º Os atendimentos à pessoa com TEA em âmbito municipal devem ser informados ao órgão competente para a atualização do cadastro a que se refere o § 1º deste artigo, na forma do regulamento.

Art. 4º A prestação de serviços públicos à pessoa com Transtorno do Espectro Autista será realizada de forma integrada pelos serviços municipais de saúde, educação e assistência social.

Parágrafo único. Compete ao Município criar e manter programa permanente de capacitação e atualização em autismo, estruturado e ministrado por equipe multiprofissional, a fim de garantir informação, treinamento, formação e especialização aos profissionais que atuam na prestação de serviços à população com TEA, tendo como principais objetivos:

I - o desenvolvimento de estratégias pedagógicas e o uso de recursos de acessibilidade, por meio da avaliação pedagógica funcional do estudante, com vistas à superação de barreiras, que promovam o Atendimento Educacional Especializado das pessoas com Transtorno do Espectro Autista em todas as suas dimensões;

II - a garantia de acesso ao currículo, assegurando-se o direito de aprendizagem no que diz respeito à elaboração de estratégias pedagógicas que assegurem às pessoas com Transtorno do Espectro Autista o mencionado acesso, de maneira que eliminem as barreiras e tenham garantidos os direitos de aprendizagem, possibilitando o seu desenvolvimento integral;

III - a produção e a difusão de conhecimentos, metodologias e informações nas áreas de saúde, educação e assistência social, fundamentados em práticas baseadas em evidências científicas;

IV - a elaboração de estudos que gerem indicadores locais capazes de auxiliar no desenvolvimento, fortalecimento e aperfeiçoamento da Política tratada nesta Lei.

Art. 5º É assegurado o acesso a ações e serviços municipais de saúde que garantam a atenção integral às necessidades das pessoas com TEA, devendo o Município garantir:

I - diagnóstico precoce, ainda que não definitivo;

II - atendimento multiprofissional no Sistema Municipal de Saúde;

III - informações que auxiliem no diagnóstico e no tratamento das condições coexistentes;

IV - orientação nutricional e farmacêutica adequada;

V - orientação aos familiares e responsáveis pelos cuidados da pessoa com TEA, quando for o caso.

§ 1º Para a garantia dos direitos previstos no caput deste artigo, observar-se-á além do disposto nesta Lei, a legislação de regência do Sistema Único de Saúde - SUS, sem prejuízo de outras normas aplicáveis, bem como a "Linha de cuidado para a atenção às pessoas com transtornos do espectro do autismo e suas famílias na rede de atenção psicossocial do Sistema Único de Saúde" do Ministério da Saúde.

§ 2º As linhas terapêuticas devem observar as idiossincrasias de cada pessoa com TEA, não devendo os serviços adotar um único modelo de abordagem terapêutica.

§ 3º Sempre que for necessária a internação da pessoa com TEA, esta deverá ser feita de maneira humanizada e assistida, a fim de preservar a saúde do paciente e reestabelecer seu equilíbrio.

Art. 6º Incumbe ao Município assegurar, criar, desenvolver, implementar, incentivar, acompanhar e avaliar a inclusão da pessoa com TEA na Rede Municipal de Ensino, devendo, para tanto:

I - promover cursos de capacitação continuada e intersetorial voltados aos profissionais que atuam na Rede Municipal de Ensino, visando à inclusão de alunos com TEA;

II - disponibilizar acompanhamento especializado para apoiar o estudante com Transtorno do Espectro Autista dentro do contexto da classe comum do ensino regular, quando necessário e avaliado pela equipe de educação especial, podendo este apoio ser de caráter temporário ou permanente, conforme mensurado no Plano de Atendimento Educacional Especializado, com a devida identificação de barreiras de acesso ao currículo;

III - garantir suporte escolar complementar especializado no contraturno, para o aluno com TEA incluído em classe comum do ensino regular;

IV - garantir, na rede pública municipal de ensino, a matrícula dos estudantes da Educação Especial nas classes comuns, bem como assegurar a oferta do Atendimento Educacional Especializado - AEE, quando necessário e após avaliação educacional especializada, amparadas pelo Plano de AEE;

V - garantir as mobilizações indispensáveis ao atendimento das necessidades específicas dos estudantes da Educação Especial, assegurando-se o acesso e a permanência em diferentes tempos e espaços educativos, considerada a neurodiversidade apresentada pelos estudantes com TEA;

VI - garantir o acesso ao ensino voltado para jovens e adultos (EJA) às pessoas com TEA que atingiram a idade adulta sem terem sido devidamente escolarizadas;

VII - assegurar o acompanhamento por profissional de psicopedagogia, quando após avaliação multiprofissional for identificado problema de aprendizagem.

§ 1º As mobilizações indispensáveis ao atendimento das necessidades específicas dos estudantes público da Educação Especial a que se refere o inciso V do caput deste artigo deverão ser consideradas no Projeto Político-Pedagógico - PPP de todas as Unidades Educacionais/Espaços Educativos da Rede Municipal de Ensino.

§ 2º Poderão ser implementadas, quando for o caso, ferramentas de comunicação alternativa, a fim de proporcionar técnicas efetivas de ensino aos alunos com TEA.

Art. 7º É vedada a cobrança de valores diferenciados de qualquer natureza para as pessoas com TEA nas mensalidades, anuidades e matrículas das instituições privadas de ensino localizadas no Município de Jaraguá do Sul, as quais estão obrigadas a promover as adaptações necessárias à inclusão dos alunos com TEA, nos mesmos termos do art. 6º desta Lei, nos termos previstos pelo artigo 28 da Lei Federal nº 13.146, de 6 de julho de 2015.

Art. 8º As pessoas com TEA têm direito ao transporte, de forma digna e de acordo com suas necessidades, incluindo:

I - o direito a estacionamento de veículos que transportem pessoas com TEA, na forma da legislação específica, nas vagas reservadas e sinalizadas como vagas destinadas ao uso de pessoas com deficiência, nas vias públicas e nas vias e áreas de estacionamento aberto ao público de estabelecimentos de uso coletivo;

II - a isenção do pagamento da tarifa no Serviço Público de Transporte Coletivo de Passageiros no Município de Jaraguá do Sul referente às pessoas com deficiência e acompanhante, conforme o regramento instituído pela Lei Municipal Nº 7.498/2017, de 16/11/2017.

Art. 9º A pessoa com TEA tem direito à vida digna, à integridade física e moral, ao livre desenvolvimento da personalidade e à segurança, devendo ser combatida, em âmbito municipal, toda forma de discriminação contra elas praticada, em razão da neuro divergência, incluindo-se aqui a infantilização de adultos e a aversão ao contato.

Art. 10. A pessoa com TEA será protegida de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, tortura, crueldade, opressão e tratamento desumano ou degradante praticado em âmbito municipal.

Parágrafo único. A Administração Pública Municipal poderá criar canais facilitados, ou adequará canais já existentes, de denúncia às condutas descritas no caput deste artigo, bem como promoverá campanhas de combate à violência física e moral praticada contra a pessoa com TEA.

Art. 11. A Política Municipal para garantia, proteção e ampliação dos direitos das Pessoas com Transtorno do Espectro Autista (TEA) e seus familiares fica vinculada à Secretaria competente, a ser definida pelo Poder Executivo, competindo-lhe o planejamento e a gestão, a partir das seguintes atribuições:

I - coordenar e acompanhar a implementação da Política Municipal ora instituída;

II - fomentar e promover as ações de capacitação em Transtorno do Espectro Autista, em colaboração com organizações da sociedade civil, meios de comunicação, entidades de classe, instituições públicas e privadas e com a sociedade;

III - contribuir para a elaboração do Plano Plurianual - PPA, da Lei de Diretrizes Orçamentárias - LDO e da Lei Orçamentária Anual - LOA, a fim de viabilizar a política ora instituída, bem como os planos, programas, projetos e ações correlatos;

IV - articular e coordenar a estruturação da rede de atendimento à pessoa com TEA, bem como a captação de recursos para planos, programas e projetos na área de saúde, educação e assistência social voltados à implementação da política.

Art. 12. As despesas decorrentes da execução desta Lei correrão pelas dotações orçamentárias próprias, suplementadas se necessário.

Art. 13. O Poder Executivo regulamentará o disposto nesta Lei, no que couber.

Art. 14. Esta Lei entra em vigor na data da publicação.

Complemento

JUSTIFICATIVA

A presente propositura visa apresentar diretriz para o Poder Público Municipal se orientar na formulação e na realização de uma política voltada para os atendimentos de crianças, adolescentes, jovens e adultos portadores de Transtorno do Espectro Autista - TEA.

Segundo o psiquiatra Estevão Vadasz, coordenador do Programa Autista (PROTEA), do IPq, "Atender o portador de autismo de maneira completa é importante para que possamos identificar quais são suas limitações e trabalhar no seu desenvolvimento, incluindo no tratamento as terapias complementares que ajudarão no desenvolvimento e integração social, além de acompanhamento psicológico e educacional.”

Sendo assim, adquirir conhecimentos mais aprofundados sobre essa síndrome, desenvolver estudos e pesquisas que levem a práticas terapêuticas e educacionais mais eficazes, estabelecer políticas públicas que resguardem os direitos da pessoa com autismo e propiciem o acesso a atendimentos especializados são ações essenciais e configuram os objetivos do projeto de lei ora encaminhado.

A pessoa autista precisa ter um atendimento especializado para que possa se comunicar, se socializar e ter uma vida independente e autônoma. E quanto mais esclarecimento sobre o assunto, melhor o atendimento, a estimulação e a forma correta de lidar com os autistas. Nesse sentido, a união e a solidariedade entre essas famílias são fundamentais para avançar nas políticas públicas capazes de atender às necessidades dessas crianças.

Nosso município já tem alguns profissionais que atuam na rede pública, preparados para atender este público, mas é preciso ampliar, fortalecer e institucionalizar o atendimento. Atualmente, nosso município conta com os trabalhos da AMA, que presta um serviço de excelência para as pessoas com TEA, mas que em razão de espaço e questões financeiras, não tem conseguido expandir seu atendimento.

O presente projeto também visa garantir o transporte público, através do fornecimento de passe livre no transporte público para a pessoa com TEA e para o acompanhante, com direito a ocupar assentos destinados às pessoas com deficiência. Vale lembrar que considerando às deficiências/impossibilidades comunicativas da pessoa com TEA, além de dificuldades comportamentais, é indispensável considerar a necessidade de um acompanhante.

A presente propositura pretende não só chamar a atenção para a questão do autismo, como também propor diretrizes concretas para guiar o Poder Público na formulação e realização de políticas públicas para a pessoa com o Transtorno do Espectro Autista. Os pais querem que seus filhos sejam tratados como cidadãos, como pessoas que têm direitos. E que tenham os seus direitos assegurados por lei cumpridos localmente.

Face ao exposto, apresentamos este projeto de lei na certeza de sua aprovação pelos Nobres Pares desta Casa Legislativa.

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