EXCELENTÍSSIMO SENHOR PRESIDENTE DA CÂMARA MUNICIPAL E DEMAIS VEREADORES DE JARAGUÁ DO SUL
Mensagem Nº 222/2023
Remetente: Prefeito de Jaraguá do Sul
Destinatário: Câmara Municipal de Jaraguá do Sul
Objeto: Veto Total ao Projeto de Lei Nº 207/2023
Ao analisar a Proposição de Lei Nº 207/2023, que “Dispõe Sobre a Instalação de Câmeras de Segurança nas Escolas Municipais de Jaraguá do Sul e dá outras providências”, sou levado a vetá-la, pelas razões que passo a expor:
RAZÕES DO VETO
Trata-se o caso concreto de Projeto de Lei Nº 207/2023 de iniciativa do Poder Legislativo, que propõe a obrigatoriedade de Instalação de Câmeras de Segurança nas Escolas Municipais de Jaraguá do Sul, a fim da garantia da segurança da comunidade escolar, tendo como pano de fundo o ataque ao Centro Educacional Bom Pastor em Blumenau e de demais casos de violência amplamente conhecidos.
CÂMARA MUNICIPAL DE JARAGUÁ DO SUL
N E S T A
Mesmo bem intencionado, o PL Nº 207/2023 não pode prosperar como texto legiferante.
Formalmente, à primeira vista, não haveria problema na proposição legislativa, porquanto tal legitimidade é assegurada na Lei Orgânica do Município, no artigo 31-B, que define que “A iniciativa das leis ordinárias e complementares compete ao Prefeito, a qualquer Membro ou Comissão da Câmara Municipal e aos cidadãos, na forma e nos casos previstos nesta Lei” . No entanto, está-se a tratar de Educação, ou seja, matéria atinente à Educação, e aí reside o imbróglio.
É que, tem-se, a proposta de lei em epígrafe, carece de legalidade, eis que no bojo há vício de origem, conquanto a CF de 1988, no artigo 301, garante aos municípios o direito de legislar sobre interesse local, como ainda de suplementar a legislação federal e a estadual, texto legiferante repetido na Carta Constitucional de SC, no artigo 1122, também a Carta Municipal, ou seja, a Lei Orgânica, no artigo 4º, assevera que:
Compete ao Município de Jaraguá do Sul legislar sobre assuntos de interesse local com o objetivo de garantir o bem-estar de sua população e o pleno desenvolvimento de suas funções sociais, cabendo-lhe, privativamente, em especial:
[…]
V - dispor sobre a administração, a utilização e a alienação de seus bens;
Ademais, a competência exclusiva para tal proposição é do Chefe do Poder Executivo, conquanto, é sabido apenas o Chefe do Poder Executivo pode, privativamente, conforme o art. 71, inciso XII, da LOM: “dispor sobre a organização e o funcionamento da administração municipal, na forma da lei”, isso em perfeita simetria com a Carta Catarinense, em cujo art. 32 assim legisla: “São Poderes do Estado, independentes e harmônicos entre si, o Legislativo, o Executivo e o Judiciário. Parágrafo único. Salvo as expressas exceções previstas nesta Constituição, é vedado a qualquer dos Poderes delegar competências”.
Ora, os prédios educacionais são, por óbvio, pertencentes à Administração Pública. Assim, ao ordenar a instalação de sistema de vigilância o Poder Legislativo traz obrigação de cunho administrativo ao Poder Executivo, ferindo de morte tanto a Carta Magna, quanto as Cartas Estadual e Municipal, respectivamente, os textos legiferantes já mencionados nos arts. 30, 32 e 4º .
Ainda, é preciso dizer há a Lei que cria o Sistema Municipal de Ensino, a de Nº 2.561/1999, cujo primeiro artigo já estabelece que o Sistema Municipal obedecerá aos princípios constitucionais e a LDBEN - Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional:
Art.1º Esta Lei cria o Sistema Municipal de Educação de Jaraguá do Sul, obedecendo os princípios constitucionais da República Federativa do Brasil, da Constituição do Estado de Santa Catarina, da Lei Orgânica Municipal e da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, estabelecendo as diretrizes para a educação no Município de Jaraguá do Sul, em colaboração dos outros sistemas.
Não menos importante, o art. 6º da mesma lei, incumbe o Município de:
I - organizar, manter e desenvolver os órgãos e instituições oficiais do seu sistema de ensino, integrando-o às políticas e planos educacionais da União e dos Estados;
II - exercer ação redistributiva em relação às suas escolas;
III - baixar normas complementares para o seu sistema de ensino;
IV - autorizar, credenciar e supervisionar os estabelecimentos do seu sistema de ensino;
O assunto é sim tema privativo seja por ser matéria atinente à organização administrativa do município, seja por ser educacional, porquanto de exclusividade do município, eis que a regra acima é validada pela Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDBEN) que explica, no art. 7º, ao tratar da autonomia administrativa, que a educação deve agir no “cumprimento das normas gerais da educação nacional e do respectivo sistema de ensino; mais adiante, no art. 11, a LDBEN assim preconiza:
Art. 11. Os Municípios incumbir-se-ão de:
I - organizar, manter e desenvolver os órgãos e instituições oficiais dos seus sistemas de ensino, integrando-os às políticas e planos educacionais da União e dos Estados;
II - exercer ação redistributiva em relação às suas escolas; […]
E no art. 12:
Art. 12. Os estabelecimentos de ensino, respeitadas as normas comuns e as do seu sistema de ensino, terão a incumbência de:
[...]
II - administrar seu pessoal e seus recursos materiais e financeiros;
[...]
XI - promover ambiente escolar seguro, adotando estratégias de prevenção e enfrentamento ao uso ou dependência de drogas.
Ademais:
Por tratar-se de evidente matéria de organização administrativa, a iniciativa do processo legislativo está reservada ao Chefe do Poder Executivo local. Os Estados-membros e o Distrito Federal devem obediência às regras de iniciativa legislativa reservada, fixadas constitucionalmente, sob pena de violação do modelo de harmônica tripartição de poderes, consagrado pelo constituinte originário. (…) [ADI 1.182, rel. min. Eros Grau, j. 24-11-2005, P, DJ de 10-3-2006.] = RE 508.827 AgR, rel. min. Cármen Lúcia, j. 25-9-2012, 2ª T, DJE de 19-10-2012.
E não fosse isso, o que não é pouco, a norma em questão cria política pública na qual o Poder Executivo fica obrigado à instalação de equipamentos em todas as unidades escolares (o conceito de unidade escolar engloba escolas e centros de educação), sem conquanto dizer a fonte de recurso, em franca contrariedade ao princípio da separação dos poderes expresso na, repita-se, na Carta Catarinense, no art. 32: “São Poderes do Estado, independentes e harmônicos entre si, o Legislativo, o Executivo e o Judiciário. Parágrafo único. Salvo as expressas exceções previstas nesta Constituição, é vedado a qualquer dos Poderes delegar competências”.
Na lição do doutrinador Hely Lopes Meirelles3 [3] (1993, p. 438/439):
A atribuição típica e predominante da Câmara é a 'normativa', isto é, a de regular a administração do Município e a conduta dos munícipes, no que afeta aos interesses locais. A Câmara não administra o Município; estabelece, apenas, normas de administração. Não executa obras e serviços públicos; dispõe, unicamente, sobre a sua execução. Não compõe nem dirige o funcionalismo da Prefeitura; edita, tão-somente, preceitos para sua organização e direção. Não arrecada nem aplica as rendas locais; apenas institui ou altera tributos e autoriza sua arrecadação e aplicação. Não governa o Município; mas regula e controla a atuação governamental do Executivo, personalizado no Prefeito. Eis aí a distinção marcante entre missão 'normativa' da Câmara e a função 'executiva' do Prefeito; o Legislativo delibera e atua com caráter regulatório, genérico e abstrato; o Executivo consubstancia os mandamentos da norma legislativa em atos específicos e concretos de administração.(...)
Também importantíssimo salientar que as Unidades Escolares (UEs), já detêm vigilância por monitoramento na maioria de seus espaços por iniciativa do Poder Executivo (a quem compete, repita-se, a administração dos prédios), sem se descurar de que Jaraguá do sul recentemente foi aclamada, mais uma vez, na “classificação é do Anuário 2023 Cidades Mais Seguras do Brasil, do site My Side - Guia Imóveis. O indicador exclusivo leva em conta a taxa de óbitos violentos a cada 100 mil habitantes por município brasileiro”4, bem por isso a implementação tem sido feita com cuidado e respeitando-se o orçamento público e as prioridades educacionais.
Melhor sorte, além da inconstitucionalidade por vício de origem, não tem o projeto de lei que não seja o veto, porquanto não aponta a fonte orçamentária, ou seja, cria despesa à margem da lei orçamentária do município e do orçamento educacional.
Aliás, o TJRJ5, pelos mesmos motivos aqui postos, julgou inscontitucional lei de matéria sinonímia a aqui vetada:
DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. LEI MUNICIPAL QUE DISPÕE SOBRE A INSTALAÇÃO DE CÂMERAS DE MONITORAMENTO DE SEGURANÇA NAS ESCOLAS PÚBLICAS MUNICIPAIS E CERCANIAS. VIOLAÇÃO AOS ARTIGOS 7º, 112, § 1º, INCISO II, ALÍNEA “d” E 145, INCISO VI, DA CONSTITUIÇÃO ESTADUAL. MATÉRIA ATINENTE À ORGANIZAÇÃO E AO FUNCIONAMENTO DE ÓRGÃOS DA REDE EDUCA-CIONAL DA ADMINISTRAÇÃO MUNICIPAL. COMPETÊNCIA PRIVATIVA DO CHEFE DO PODER EXECUTIVO. PROCEDÊNCIA DO PEDIDO.
Ante o exposto e, ressaltando-se o artigo 30, da Constituição Federal; os artigos 32 e 112 da Constituição de Santa Catarina; os artigos 4º e 71 da Lei Orgânica do Município, a LOM; a Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDBEN), Lei Federal Nº 9.394/1996; a Lei de Sistema de Ensino, Lei Municipal Nº 2.561/1999, sou levado a VETAR TOTALMENTE o Projeto de Lei Nº 207/2023, que “Dispõe Sobre a Instalação de Câmeras de Segurança nas Escolas Municipais de Jaraguá do Sul e dá outras providências”, a uma: por ser competência exclusiva do Chefe do Poder Executivo tal matéria; a duas: a política de monitoramento já está em execução pelo Poder executivo; a três; além do vício de origem não há menção a lastro orçamentário.
Sem mais, Exmo. Sr. Presidente, estas são as razões que me levaram a vetar totalmente o Projeto de Lei Nº 207/2023, devolvendo-o ao reexame dessa Egrégia Câmara Municipal.
Jaraguá do Sul, 30 de novembro de 2023.