Câmara Municipal de Três Corações - MG

Lei Ordinária nº 4662/2022
de 11/03/2022
Ementa

Veda a contratação, em cargos públicos diretos, indiretos e em comissão, de pessoas condenadas pelos crimes mencionados por esta lei, no âmbito do Município de Três Corações/MG, e dá outras providências.

Alteração / Revogação Documento Oficial Documento Consolidado Imagem da Lei
Texto

Art. 1º Fica vedada, no âmbito do Município de Três Corações/MG, a contratação para cargos públicos, empregos públicos e em cargos em comissão de livre nomeação e exoneração, de pessoas que tiverem sido condenadas nas seguintes condições:

I - Crime de Violência doméstica e familiar contra a mulher, previsto na Lei Federal nº 11.340, de 07 de agosto de 2006 - Lei Maria da Penha;

II - Crimes de Homicídio e Feminicídio, previstos no art. 121 do Decreto-Lei Federal nº 2.848, de 07 de dezembro de 1940 - Código Penal Brasileiro;

III - Crime de Injúria, previsto no § 3º do art. 140 do Decreto Lei 2848, de 7 de dezembro de 1940, que define os crimes resultantes de preconceito de raça ou de cor;

IV - Crime de Racismo, previsto na Lei Federal nº 7.716, de 5 de janeiro de 1989, define os crimes resultantes de preconceito de raça ou de cor.

§ 1º A vedação inicia-se com a condenação em decisão transitada em julgado, até o comprovado cumprimento da pena.

§ 2º A vedação prevista no caput deste artigo deverá constar nos editais de concurso público, cabendo ao candidato proceder à apresentação das respectivas certidões negativas antes de sua posse.

§ 3º Nos casos em que a nomeação for destinada a cargos de livre provimento e exoneração, constará nos formulários próprios para a sua contratação a solicitação das devidas certidões criminais negativas, que deverão ser apresentadas sem as anotações referentes ao caput deste artigo.

Art. 2º As vedações previstas nesta lei terão efeitos na administração pública direta, indireta e autarquias sob responsabilidade do Município.

Art. 3º  Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação, nos termos do art. 174 da Lei Orgânica Municipal.

Complemento

Justificativa:

Encaminho aos meus nobres Pares esse Projeto de Lei que prevê a vedação da contratação, em cargos públicos diretos, indiretos e em comissão, de pessoas condenadas pelos crimes mencionados por esta lei.

A matéria regulamenta no Município de Três Corações, a proibição de contratar pessoas para cargos públicos condenadas em decisão transitada em julgado, até o comprovado cumprimento da pena, nos crimes de "Violência doméstica e familiar contra a mulher", "Homicídio e Feminicídio", "Injúria" e "Racismo".

A Lei Federal nº 11.340, de 07 de agosto de 2006 - Lei Maria da Penha, cria mecanismos para coibir e prevenir a violência doméstica e familiar contra a mulher, nos termos do § 8º do art. 226 da Constituição Federal, da Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Violência contra a Mulher, da Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher e de outros tratados internacionais ratificados pela República Federativa do Brasil; dispõe sobre a criação dos Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher; e estabelece medidas de assistência e proteção às mulheres em situação de violência doméstica e familiar.

Em seu art. 3º, § 1º, determina que "o poder público desenvolverá políticas que visem garantir os direitos humanos das mulheres no âmbito das relações domésticas e familiares no sentido de resguardá-las de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão. E, no § 2º deste mesmo artigo determina que "cabe à família, à sociedade e ao poder público criar as condições necessárias para o efetivo exercício dos direitos enunciados no caput".

O Decreto-Lei Federal nº 2.848, de 07 de dezembro de 1940 - Código Penal Brasileiro, em seu art. 121, define os critérios para a penalização de crimes de homicídio e de feminicídio (este, incluído pela Lei nº 13.104/2015). Sobre este, podemos apresentar dados atuais, como por exemplo o fato de que em meio ao isolamento social, o Brasil contabilizou 1.350 casos de feminicídio em 2020 - um a cada seis horas e meia, segundo o Fórum Brasileiro de Segurança Pública, sendo este número 0,7% maior comparado ao total de 2019. Os casos de homicídio motivado por questões de gênero subiram em 14 das 27 unidades federativas, de acordo com o relatório. Houve crescimento acentuado em Mato Grosso (57%), Roraima (44,6%), Mato Grosso do Sul (41,7%) e Pará (38,95). Em Rondônia, os feminicídios também saltaram de sete ocorrências, em 2019, para 14 no ano passado.

Três a cada quatro vítimas de feminicídio tinham entre 19 e 44 anos. A maioria (61,8%) era negra. Em geral, o agressor é uma pessoa conhecida: 81,5% dos assassinos eram companheiros ou ex-companheiros, enquanto 8,3% das mulheres foram mortas por outros parentes. Ao contrário dos homicídios comuns, em que há maior prevalência de arma de fogo, as armas brancas foram mais usadas contra as mulheres. Em 55,1% das ocorrências, as mortes foram provocadas por facas, tesouras, canivetes ou instrumentos do tipo.

A Lei Federal nº 9.459, de 13 de maio de 1997 acresceu ao Código Penal Brasileiro, em seu art. 140, o parágrafo 3º que define que "se a injúria consiste na utilização de elementos referentes a raça, cor, etnia, religião ou origem", a pessoa deve ser penalizada com "reclusão de um a três anos e multa". O intuito da norma é de preservar os objetivos fundamentais descritos na Constituição Federal, mais especificamente de promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação.

O crime de injúria racial está inserido no capítulo dos crimes contra a honra, que prevê uma forma qualificada para o crime de injúria, na qual a pena é maior e não se confunde com o crime de racismo, previsto na Lei 7716/1989. Para sua caracterização é necessário que haja ofensa à dignidade de alguém, com base em elementos referentes à sua raça, cor, etnia, religião, idade ou deficiência. Nesta hipótese, a pena pode ir de 1 a 3 anos de reclusão. Os crimes de racismo estão previstos na Lei 7.716/1989, que foi elaborada para regulamentar a punição de crimes resultantes de preconceito de raça ou de cor, conhecida como Lei do Racismo. No entanto, a Lei nº 9.459/13 acrescentou à referida lei os termos etnia, religião e procedência nacional, ampliando a proteção para vários tipos de intolerância. Como o intuito dessa norma é preservar os objetivos fundamentais descritos na Constituição Federal, de promoção do bem estar de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação, as penas previstas são mais severas e podem chegar até a 5 anos de reclusão.

O que diferencia os crimes é o direcionamento da conduta, enquanto que na injúria racial a ofensa é direcionada a um indivíduo especifico, no crime de racismo, a ofensa é contra uma coletividade, por exemplo, toda uma raça, não há especificação do ofendido.

O Brasil é reconhecido pela população como um país racista, segundo pesquisa do Instituto Locomotiva, sendo que poucos assumem suas atitudes de preconceito racial - e outros ainda demonstram não compreender de fato a dimensão do problema. Essa pesquisa ainda identificou que há um problema estrutural que é a maior presença de negros nas classes sociais mais baixas, o que faria com que a população negra utilizasse mais os serviços públicos de saúde e educação, tendo maior dificuldade de inserção no mercado de trabalho, especialmente nos cargos de liderança. E, quando inseridos, o preconceito continuaria, uma vez que 52% dos trabalhadores negros já sofreram alguma discriminação. Além disso, 54% acreditariam que brasileiros não reagiriam bem diante de um chefe negro.

Por meio da pesquisa se confirmou ainda que o preconceito racial é frequente no varejo e demais ambientes públicos, uma vez que 61% dos brasileiros presenciaram uma pessoa negra (preta ou parda) sendo humilhada ou discriminada devido à sua raça/cor em lojas, shoppings, restaurantes ou supermercados. E, o percentual aumenta para 71% quando pretas. Além disso, 69% pessoas negras já foram seguidas por seguranças em lojas. Entre as pessoas pretas, o percentual atinge 76%. Além isso, 89% dos brasileiros reconhecem que as pessoas negras sofrem mais violência física do que as brancas.

Segundo o professor Gustavo Boudoux,

"No exercício das mais diversas funções públicas, os servidores, além das normatizações vigentes nos órgãos e entidades públicas que regulamentam e determinam a forma de agir dos agentes públicos, devem respeitar os valores éticos e morais que a sociedade impõe para o convívio em grupo. A não observação desses valores acarreta uma série de erros e problemas no atendimento ao público e aos usuários do serviço, o que contribui de forma significativa para uma imagem negativa do órgão e do serviço.

Um dos fundamentos que precisa ser compreendido é o de que o padrão ético dos servidores públicos no exercício de sua função pública advém de sua natureza, ou seja, do caráter público e de sua relação com o público.

O servidor deve estar atento a esse padrão não apenas no exercício de suas funções, mas 24 horas por dia durante toda a sua vida. O caráter público do seu serviço deve se incorporar à sua vida privada, a fim de que os valores morais e a boa-fé, amparados constitucionalmente como princípios básicos e essenciais a uma vida equilibrada, se insiram e sejam uma constante em seu relacionamento com os colegas e com os usuários do serviço. [...]

A ética é pautada na conduta responsável das pessoas."

Cabe ao Pode Público zelar pela manutenção de princípios éticos no trato da coisa pública, e assim normatizar o acesso de seus servidores a cargos públicos. Acreditamos que ao nomear estas Leis e impor sanções, a nível da administração municipal, a quem as infringe, estamos estimulando os interessados em assumir cargos públicos a adotarem com o máximo senso de responsabilidade, princípios éticos e morais, ao custo de não poderem ter acesso a estes cargos. É esta uma forma de proteger nossos cidadãos mais vulneráveis, sobretudo as mulheres e as vítimas de injúria e racismo.

Por estas razões antes elucidadas, acredito na sensibilidade de meus pares para a rápida aprovação deste Projeto de Lei.

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