Senhor Presidente,
Em cumprimento ao disposto na Lei Orgânica Municipal, venho por esta mensagem de veto, comunicar a Vossa Excelência o veto total por mim aposto ao Projeto de Lei que, “Dispõe sobre medidas de apoio econômico e benefícios fiscais a empresas dos setores de comércio e serviços, microempreendedores individuais e trabalhadores autônomos que foram atingidos pela suspensão de atividades em virtude da pandemia do novo Coronavírus/COVID19.”
O Projeto de Lei nº 5351/2021 que “Dispõe sobre medidas de apoio econômico e benefícios fiscais a empresas dos setores de comércio e serviços, microempreendedores individuais e trabalhadores autônomos que foram atingidos pela suspensão de atividades em virtude da pandemia do novo Coronavírus/COVID19.”, apresenta vícios insanáveis de formalidade, legalidade e inconstitucionalidade formal e material, e, consequente nulidade, quanto à iniciativa, bem como à criação de despesa não prevista no orçamento anual do Município e ainda, pela inviabilidade de execução ante a total ilegalidade do projeto e violação aos dispositivos legais, em especial ao que determina a Lei de Responsabilidade Fiscal – Lei nº 101/2000 e a Lei Municipal nº 4.492/2020.
O Projeto de Lei nº 5351/2021 apresenta vícios insanáveis de legalidade e inconstitucionalidade, posto que as leis que disponham acerca de matéria orçamentária e despesa são de iniciativa privativa do Prefeito, conforme prevê expressamente o inciso III do artigo 100 da Lei Orgânica do Município de Três Corações, senão vejamos:
Art. 100 - São de iniciativa privativa do Prefeito, as leis que disponham sobre:
(...)
III - organização administrativa, matéria orçamentária, serviços públicos e pessoal da administração;(NR) (grifamos)
A norma que cria obrigação à municipalidade, impondo aumento de despesa, é de iniciativa exclusiva do Chefe do Poder Executivo, sendo que o Poder Legislativo, ao criar norma dessa envergadura, viola o disposto no artigo 66, inciso III, da Constituição do Estado de Minas Gerais, aplicável, aos municípios, pelo princípio da simetria.
Além disso, o Poder Legislativo também ofende aos princípios da harmonia e separação dos poderes, quando interfere diretamente na autonomia e independência dos poderes.
Dessa forma o Projeto de Lei nº 5351/2021 fere o disposto no artigo 153 e seguintes da Constituição Estadual de Minas Gerais, ao criar despesa não prevista na lei de diretrizes orçamentárias ou no orçamento anual do Município de Três Corações, pois cria medida que, para implantação, exigirá gastos não previstos em lei.
Sobretudo, há que se atentar que para a criação de uma norma municipal deve ser observada a hierarquia das leis e procedimentos, bem como a normatização já existente, não podendo ser elaborada lei que conceda isenções de tributos e taxas e benefícios, sem o rigor dos procedimentos legais e análise de viabilidade.
O Projeto de Lei nº 5351/2021 apresenta-se em total contrariedade ao disposto nas legislações aplicáveis, mormente ao que dispõe a Lei de Responsabilidade Fiscal – Lei nº 101/2000, ferindo fatalmente seu artigo 14, senão vejamos:
Art. 14. A concessão ou ampliação de incentivo ou benefício de natureza tributária da qual decorra renúncia de receita deverá estar acompanhada de estimativa do impacto orçamentário-financeiro no exercício em que deva iniciar sua vigência e nos dois seguintes, atender ao disposto na lei de diretrizes orçamentárias e a pelo menos uma das seguintes condições:
I - demonstração pelo proponente de que a renúncia foi considerada na estimativa de receita da lei orçamentária, na forma do art. 12, e de que não afetará as metas de resultados fiscais previstas no anexo próprio da lei de diretrizes orçamentárias;
II - estar acompanhada de medidas de compensação, no período mencionado no caput, por meio do aumento de receita, proveniente da elevação de alíquotas, ampliação da base de cálculo, majoração ou criação de tributo ou contribuição.
§ 1o A renúncia compreende anistia, remissão, subsídio, crédito presumido, concessão de isenção em caráter não geral, alteração de alíquota ou modificação de base de cálculo que implique redução discriminada de tributos ou contribuições, e outros benefícios que correspondam a tratamento diferenciado.
§ 2o Se o ato de concessão ou ampliação do incentivo ou benefício de que trata o caput deste artigo decorrer da condição contida no inciso II, o benefício só entrará em vigor quando implementadas as medidas referidas no mencionado inciso.
§ 3o O disposto neste artigo não se aplica:
I - às alterações das alíquotas dos impostos previstos nos incisos I, II, IV e V do art. 153 da Constituição, na forma do seu § 1º;
II - ao cancelamento de débito cujo montante seja inferior ao dos respectivos custos de cobrança.
Ao que demonstra, quando da propositura e aprovação da redação final do Projeto de Lei nº 5351/2021 não foi observada a regra contida na Carta Magna e tampouco o dispositivo alhures, posto que em singela análise, verifica-se a determinação taxativa da obrigatoriedade de acompanhamento, em norma dessa envergadura, de estimativa de impacto orçamentário-financeiro e medidas de compensação, o que, notadamente, constituem atos do Poder Executivo, restando inconteste a competência privativa para a proposição de legislação acerca da matéria rechaçada.
Observa-se a total discrepância da redação final do PL Nº 5351/2021, vez que no parágrafo único do art.1º transcreve a parte final do § 1º do artigo 32 da Lei Municipal nº 4.492/2020, no entanto, de maneira incompreendida, não cumpre ao que determina o caput do dispositivo mencionado, senão vejamos:
Art. 32. Não será aprovado Projeto de Lei que conceda ou amplie incentivo, isenção ou benefício de natureza tributária ou financeira, sem a prévia estimativa do impacto orçamentário – financeiro decorrente de renúncia de receita correspondente.
§ 1º Caso o dispositivo legal sancionado tenha impacto financeiro no mesmo exercício, o Poder Executivo adotará as medidas necessárias à contenção das despesas em valores equivalentes.
Ora, a Lei Municipal nº 4.492/2020 (Lei que Estabelece as Diretrizes Orçamentárias para 2021), diga-se de passagem aprovada por essa Casa Legislativa, veda a aprovação de Projeto de Lei que conceda ou amplie incentivo, isenção ou benefício de natureza tributária ou financeira, sem a prévia estimativa do impacto orçamentário – financeiro, não foi observada pelo nobres edis quando da elaboração e aprovação da redação final do PL Nº 5351/2021.
Ademais, a inviabilidade de execução do Projeto de Lei nº 5351/2021 ainda denota-se claramente da ausência de comprovação de interesse público para renunciar a receita constante da redação do artigo 2º, podendo acarretar improbidade administrativa:
“Renunciar à receita é deixar de receber valores que poderiam ser utilizados para realização de despesas visando diversos direitos e efetivação de políticas públicas, daí a necessidade de serem limitadas, para que sejam realizadas apenas quando necessárias ao interesse público.”
Como se não bastasse, redação contida no inciso I do art. 3º do PL nº 5351/2021 prevê, de maneira totalmente infundada, a suspensão da inscrição no CADIN e na Dívida Ativa Municipal os débitos relativos a taxas e tributos municipais vencidos e não pagos, ao passo que o Município não tem qualquer competência para inscrição ou suspensão de inscrição junto ao CADIN, haja vista tratar-se de cadastro de uso exclusivo da Administração Pública Federal.
A título de esclarecimentos, vejamos as informações do Ministério da Economia a respeito do CADIN:
O CADIN – Cadastro Informativo de Créditos não Quitados do Setor Público Federal – é um banco de dados no qual estão registrados os nomes de pessoas físicas e jurídicas em débito para com órgãos e entidades federais. O CADIN é um Cadastro utilizado somente pela Administração Pública Federal, direta e indireta e poderes legislativo e judiciário. Cabe à Secretaria do Tesouro Nacional expedir orientações de natureza normativa a respeito do CADIN e ao Banco Central do Brasil administrar e disponibilizar, através do SISBACEN, as informações que compõem o banco de dados do cadastro em vista. O CADIN é regulado pela Lei nº 10.522, de 19 de julho de 2002 e Portaria STN nº 685, de 14 de setembro de 2006.
Ad argumentandum, observa-se de maneira clara e repetidamente, a total ilegalidade e inconstitucionalidade do PL Nº 5351/2021, razão pela qual não poderá integrar o ordenamento jurídico municipal, ante a previsão de suspensão de inscrição em cadastro federal, vez que não compete ao Município qualquer acesso ou utilização, sendo que o Cadastro Informativo de Créditos não Quitados do Setor Público Federal - CADIN consiste em cadastro utilizado somente pela Administração Pública Federal, restando inexequível o sobredito PL.
Contudo, o veto total insurge-se diante da inconstitucionalidade do Projeto de Lei resultante da usurpação do poder de iniciativa. Conforme precedente do Supremo Tribunal Federal, até mesmo a ulterior aquiescência do Chefe do Poder Executivo, mediante sanção, não tem o condão de sanar o vício da inconstitucionalidade de usurpação, conforme se observa da superação do enunciado 5 do STF:
“O desrespeito à prerrogativa de iniciar o processo de positivação formal do Direito, gerado pela usurpação do poder sujeito à cláusula de reversa, traduz vício jurídico de gravidade inquestionável, cuja ocorrência reflete típica hipótese de inconstitucionalidade formal, apta a infirmar, de modo irremissível, a própria integridade jurídica do ato legislativo eventualmente editado. Dentro desse contexto - em que se ressalta a imperatividade da vontade subordinante do poder constituinte -, nem mesmo a aquiescência do Chefe do Executivo mediante sanção ao projeto de lei, ainda quando dele seja a prerrogativa usurpada, tem o condão de sanar esse defeito jurídico radical. Por isso mesmo, a tese da convalidação das leis resultantes do procedimento inconstitucional de usurpação - ainda que admitida por esta Corte sob a égide da Constituição de 1946 (Súmula n.º 5) - não mais prevalece, repudiada que foi seja em face do magistério da doutrina (...), seja, ainda, em razão da jurisprudência dos Tribunais, inclusive a desta Corte (...)." (ADI 1197, Relator Ministro Celso de Mello, Tribunal Pleno, julgamento em 18.5.2017, DJe de 31.5.2017).
Nesse sentido: ADI 2113, Relatora Ministra Cármen Lúcia, Tribunal Pleno, julgamento em 4.3.2009, DJe de 21.8.2009; ADI 2867, Relator Ministro Celso de Mello, Tribunal Pleno, julgamento em 3.12.2003, DJe de 9.2.2007; ADI 1381 MC, Relator Ministro Celso de Mello, Tribunal Pleno, julgamento em 7.12.1995, DJe de 6.6.2003; ADI 1438, Relator Ministro Ilmar Galvão, Tribunal Pleno, julgamento em 5.9.2002, DJe de 8.11.2002; ADI 700, Relator Ministro Maurício Corrêa, Tribunal Pleno, julgamento em 23.5.2001, DJe de 24.8.2001; Rp 890, Relator Ministro Oswaldo Trigueiro, Tribunal Pleno, julgamento em 27.3.1974, DJe de 7.6.1974.
Ex positis, o Projeto de Lei nº 5351/2021 que, “Dispõe sobre medidas de apoio econômico e benefícios fiscais a empresas dos setores de comércio e serviços, microempreendedores individuais e trabalhadores autônomos que foram atingidos pela suspensão de atividades em virtude da pandemia do novo Coronavírus/COVID19.”, apresentado por membros da Câmara Municipal, apresenta vício insanável de legalidade, formalidade e inconstitucionalidade formal e material, acerca da usurpação de iniciativa, em razão da competência privativa do Poder Executivo de legislar acerca de matéria orçamentária e despesa, bem como à criação de despesa não prevista no orçamento anual do Município e ainda, pela inviabilidade de execução, posto que totalmente contraditório ao determinado na Lei de Responsabilidade Fiscal – Lei nº 101/2000, Lei Municipal nº 4.492/2020 – LDO para 2021 e ainda pela renúncia de receita sem comprovação de interesse público em total afronta ao princípio de legalidade, o que acarretam nulidade ao Projeto, ao passo que compete privativamente ao Poder Executivo propor a legislação acerca de matéria orçamentária e despesa, nos termos do inciso III, art. 100, da Lei Orgânica do Município de Três Corações, e ainda, por violar o disposto no art. 14 da Lei de Responsabilidade Fiscal – Lei nº 101/2000 e no art.32 da Lei Municipal nº 4.492/2020 (Lei que Estabelece as Diretrizes Orçamentárias para 2021).
Diante das considerações apresentadas, demonstrados os óbices que impedem a sanção do texto do Projeto de Lei nº 5351/2021, em virtude de sua inconstitucionalidade formal em razão de vício de iniciativa e material em razão de violação ao princípio da legalidade, quanto à criação de despesa não prevista no orçamento anual do Município e diante da afronta ao que dispõem a Lei de Responsabilidade Fiscal – Lei nº 101/2000 e a Lei Municipal nº 4.492/2020, bem como pela impossibilidade do Poder Público Municipal promover suspensão em cadastro de competência e uso exclusivo da Administração Pública Federal, apresentando-se totalmente inexequível, pelo o que somos levados a propor o veto em sua totalidade ao citado Projeto de Lei, não podendo o mesmo fazer parte do ordenamento jurídico municipal.
Pelo exposto, é o presente veto total, a fim de apreciação dessa Ilustre Casa Legislativa.
Atenciosamente,
JOSÉ ROBERTO DE PAIVA GOMES
Prefeito de Três Corações – MG