Senhor Presidente,
Em cumprimento ao disposto na Lei Orgânica Municipal, em especial o artigo 105, venho por esta mensagem de veto, comunicar a Vossa Excelência o veto total por mim aposto ao Projeto de Lei 5839/2023 que “Dispõe sobre o estacionamento de motoboys e regulamenta as respectivas vagas de estacionamento nas áreas urbanas.”
O Projeto de Lei nº 5839/2023, apresenta vícios insanáveis de formalidade, legalidade e inconstitucionalidade formal e material, e, consequente nulidade, senão vejamos:
O Projeto de Lei nº 5839/2023, apresenta vícios insanáveis quanto à iniciativa, bem como à criação de despesa não prevista no orçamento anual do Município e ainda, pela inviabilidade de execução ante a total ilegalidade do projeto e violação aos dispositivos legais, em especial ao que determina a Lei de Responsabilidade Fiscal – Lei nº 101/2000, a Lei Municipal nº 4.728/2022, a Lei Orgânica do Município de Três Corações e as Resoluções CONTRAN nº 943, de 28 de março de 2022 e nº 973, de 18 de julho de 2022.
As leis que disponham acerca de serviços públicos, matéria orçamentária e despesa, bem como das atribuições dos órgãos da administração pública municipal são de iniciativa privativa do Prefeito, conforme prevê expressamente os incisos III e IV do artigo 100 da Lei Orgânica do Município de Três Corações, senão vejamos:
Art. 100 - São de iniciativa privativa do Prefeito, as leis que disponham sobre:
(...)
III - organização administrativa, matéria orçamentária, serviços públicos e pessoal da administração;(NR)
IV - criação, estruturação e atribuições dos órgãos da administração pública municipal. (grifamos)
A norma que cria obrigação à municipalidade, impondo aumento de despesa, é de iniciativa exclusiva do Chefe do Poder Executivo, sendo que o Poder Legislativo, ao criar norma dessa envergadura, viola o disposto no artigo 66, inciso III, da Constituição do Estado de Minas Gerais, aplicável, aos municípios, pelo princípio da simetria.
Nesse sentido o recente entendimento do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais em Ação Direta de Inconstitucionalidade impetrada pelo Município de Três Corações, senão vejamos:
EMENTA: AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. MUNICÍPIO DE TRÊS CORAÇÕES. LEI N. 4668/2022. INICIATIVA PARLAMENTAR. PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS DE PSICOLOGIA E SERVIÇO SOCIAL NA REDE PÚBLICA DE EDUCAÇÃO BÁSICA. ESTRUTURAÇÃO DA SECRETARIA MUNICIPAL DE EDUCAÇÃO, CRIAÇÃO DE CARGOS PÚBLICOS E DEFINIÇÃO DAS SUAS ATRIBUIÇÕES. INICIATIVA RESERVADA DO CHEFE DO PODER EXECUTIVO. VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DA SEPARAÇÃO DOS PODERES. INCONSTITUCIONALIDADE RECONHECIDA. Os Poderes Legislativo e Executivo do Município devem obediência às regras de iniciativa legislativa reservada, fixadas constitucionalmente, sob pena de desrespeito ao postulado da separação dos poderes. Ao disciplinar a organização dos Poderes, a Constituição Estadual delimitou as funções que incumbem exclusivamente ao Chefe do Poder Executivo em norma de observância obrigatória pelos Municípios mineiros em obediência ao princípio da simetria. A Lei n. 4668/2022, do Município de Três Corações, ao cuidar da estruturação da Secretaria de Educação e criar novos cargos públicos, dispondo sobre suas atribuições e seu regime jurídico, usurpou competência privativa do Chefe do Poder Executivo e violou o princípio constitucional da separação de poderes, o que implica reconhecer a sua inconstitucionalidade. (TJMG - Ação Direta Inconst 1.0000.22.133672-0/000, Relator(a): Des.(a) Edilson Olímpio Fernandes , ÓRGÃO ESPECIAL, julgamento em 15/02/2023, publicação da súmula em 27/02/2023) (grifamos)
Dessa forma o Projeto de Lei nº 5839/2023 fere o disposto no artigo 153 e seguintes da Constituição Estadual de Minas Gerais, ao criar despesa não prevista na lei de diretrizes orçamentárias ou no orçamento anual do Município de Três Corações, vez que, para implantação e fiscalização, exigirá gastos não previstos em lei.
Sobretudo, há que se atentar que para a criação de uma norma municipal deve ser observada a hierarquia das leis e procedimentos, não podendo ser elaborada lei que crie medidas, penalidades e gere despesas, sem o rigor dos procedimentos legais e análise de viabilidade.
O Projeto de Lei nº 5839/2023 apresenta-se em total contrariedade ao disposto nas legislações aplicáveis, mormente ao que dispõe a Lei de Responsabilidade Fiscal – Lei nº 101/2000, ferindo fatalmente seus artigos 16 e 17, senão vejamos:
Art. 16. A criação, expansão ou aperfeiçoamento de ação governamental que acarrete aumento da despesa será acompanhado de:
I - estimativa do impacto orçamentário-financeiro no exercício em que deva entrar em vigor e nos dois subseqüentes;
II - declaração do ordenador da despesa de que o aumento tem adequação orçamentária e financeira com a lei orçamentária anual e compatibilidade com o plano plurianual e com a lei de diretrizes orçamentárias.
§ 1o Para os fins desta Lei Complementar, considera-se:
I - adequada com a lei orçamentária anual, a despesa objeto de dotação específica e suficiente, ou que esteja abrangida por crédito genérico, de forma que somadas todas as despesas da mesma espécie, realizadas e a realizar, previstas no programa de trabalho, não sejam ultrapassados os limites estabelecidos para o exercício;
II - compatível com o plano plurianual e a lei de diretrizes orçamentárias, a despesa que se conforme com as diretrizes, objetivos, prioridades e metas previstos nesses instrumentos e não infrinja qualquer de suas disposições.
§ 2o A estimativa de que trata o inciso I do caput será acompanhada das premissas e metodologia de cálculo utilizadas.
§ 3o Ressalva-se do disposto neste artigo a despesa considerada irrelevante, nos termos em que dispuser a lei de diretrizes orçamentárias.
§ 4o As normas do caput constituem condição prévia para:
I - empenho e licitação de serviços, fornecimento de bens ou execução de obras;
II - desapropriação de imóveis urbanos a que se refere o § 3o do art. 182 da Constituição .Art. 17. Considera-se obrigatória de caráter continuado a despesa corrente derivada de lei, medida provisória ou ato administrativo normativo que fixem para o ente a obrigação legal de sua execução por um período superior a dois exercícios.
§ 1o Os atos que criarem ou aumentarem despesa de que trata o caput deverão ser instruídos com a estimativa prevista no inciso I do art. 16 e demonstrar a origem dos recursos para seu custeio.
§ 2o Para efeito do atendimento do § 1o, o ato será acompanhado de comprovação de que a despesa criada ou aumentada não afetará as metas de resultados fiscais previstas no anexo referido no § 1o do art. 4o, devendo seus efeitos financeiros, nos períodos seguintes, ser compensados pelo aumento permanente de receita ou pela redução permanente de despesa.
§ 3o Para efeito do § 2o, considera-se aumento permanente de receita o proveniente da elevação de alíquotas, ampliação da base de cálculo, majoração ou criação de tributo ou contribuição.
§ 4o A comprovação referida no § 2o, apresentada pelo proponente, conterá as premissas e metodologia de cálculo utilizadas, sem prejuízo do exame de compatibilidade da despesa com as demais normas do plano plurianual e da lei de diretrizes orçamentárias.
§ 5o A despesa de que trata este artigo não será executada antes da implementação das medidas referidas no § 2o, as quais integrarão o instrumento que a criar ou aumentar.
§ 6o O disposto no § 1o não se aplica às despesas destinadas ao serviço da dívida nem ao reajustamento de remuneração de pessoal de que trata o inciso X do art. 37 da Constituição.
§ 7o Considera-se aumento de despesa a prorrogação daquela criada por prazo determinado.
Ao que demonstra, quando da propositura e aprovação da redação final do Projeto de Lei nº 5839/2023 não foi observada a regra contida na Carta Magna e tampouco o dispositivo alhures, posto que em singela análise, verifica-se a determinação taxativa da obrigatoriedade de acompanhamento, em norma dessa envergadura, de estimativa de impacto orçamentário-financeiro, premissas e metologias de cálculos, origem dos recursos para custeio e medidas de compensação, o que, notadamente, constituem atos do Poder Executivo, reforçando a competência privativa para a proposição de legislação acerca da matéria rechaçada.
A redação contida no Projeto de Lei nº 5839/2023 ao impor obrigatoriedade de implantação de projeto não incluído na Lei Orçamentária anual e Plano Plurianual, recalcitra à Lei Orgânica Municipal, senão vejamos:
Art. 226 - São vedados:
I - o início de programas ou projetos não incluídos na lei orçamentária anual;
(...)
§ 1º - Nenhum investimento cuja execução ultrapasse um exercício financeiro, poderá ser iniciado sem prévia inclusão no plano plurianual, ou sem lei que autorize a inclusão, sob pena de crime de responsabilidade.
Destarte, o recente acórdão proferido pelo Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais em Ação Direta de Inconstitucionalidade impetrada pelo Município de Três Corações, senão vejamos:
EMENTA: AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE - LEI DO MUNICÍPIO DE TRÊS CORAÇÕES - LEI DE INICIATIVA DO PODER LEGISLATIVO - IMPLEMENTAÇÃO DE POLÍTICA PÚBLICA - VÍCIO FORMAL - INEXISTÊNCIA DE PRÉVIA ESTIMATIVA DO IMPACTO ORÇAMENTÁRIO E FINANCEIRO - AÇÃO JULGADA PROCEDENTE
A inexistência de estimativa do impacto orçamentário e financeiro em lei que cria despesa obrigatória configura vício formal que atrai a sua inconstitucionalidade. (TJMG - Ação Direta Inconst 1.0000.21.137416-0/000, Relator(a): Des.(a) Teresa Cristina da Cunha Peixoto , ÓRGÃO ESPECIAL, julgamento em 06/10/2022, publicação da súmula em 26/10/2022) (grifamos)
Além disso, o Poder Legislativo também está a ofender aos princípios da harmonia e separação dos poderes, interferindo diretamente na autonomia e independência do Poder Executivo (ex vi dos art’s 6º e 173 da Constituição do Estado de Minas Gerais), imiscuindo-se na sua prerrogativa de análise de conveniência e oportunidade, criando obrigação e dever de implantação, e consequentemente um serviço público, ao ditar o modus operandi do Poder Executivo Municipal no tocante às ações nas vias de tráfego e vagas de estacionamento a serem executadas pela Secretaria Municipal de Segurança Pública e Mobilidade Urbana, através de seu Departamento Municipal de Transportes e Trânsito.
Destarte, temos que padece de vício de iniciativa o Projeto de Lei nº 5839/2023, ao impor ao Executivo Municipal, a criação de obrigações, deveres de instalação de sinalização viária.
Contudo, o Regulamento de Sinalização Viária contido na Resolução CONTRAN nº 973, de 18 de julho de 2022, que tem como objetivo de estabelecer as especificações e requisitos técnicos a serem adotados em todo o território nacional, por todos os órgãos e entidades do Sistema Nacional de Trânsito (SNT), quando da implementação das soluções adotadas pela Engenharia de Tráfego e Sinalização, dispõe especificamente tais modalidades em seu MBST Volume IV - Sinalização Horizontal (Anexo IV), MBST Volume I - Sinalização Vertical de Regulamentação (Anexo I) e MBST Volume III - Sinalização Vertical de Indicação (Anexo III).
Para tanto, toda e qualquer sinalização viária, deve seguir as especificações técnicas contidas na Resolução CONTRAN nº 973, de 18 de julho de 2022, sendo vedada a implantação de sinalização diversa àquela prevista na Resolução alhures.
No que tange ao serviço remunerado de cargas por meio de motocicletas ou motonetas a normatização pertinente, qual seja, a Resolução CONTRAN nº 943, de 28 de março de 2022, que “Estabelece requisitos mínimos de segurança para o transporte remunerado de passageiros (mototáxi) e de cargas (motofrete) em motocicleta e motoneta, e dá outras providências” em nada dispõe acerca de exclusividade de vagas de estacionamento com sinalizações diferenciadas para a categoria profissional em comento, até mesmo porque, repita-se, totalmente vedada a implementação de sinalização diversa àquela constante da Resolução CONTRAN nº 973, de 18 de julho de 2022 e ainda, em detrimento ao princípio da isonomia estampado no artigo 5º da Constituição Federal, haja vista a existência de outros meios de prestação remunerada de serviços de cargas, as quais não possuem exclusividade de vagas de estacionamento, mas, tão somente vagas de carga e descarga, nos termos da legislação em vigor.
Observa-se a total discrepância e ilegalidade do Projeto de Lei nº 5839/2023 ao determinar implantação de sinalização vertical e horizontal com símbolo e inscrição diferenciadas e reserva de vaga de estacionamento sem qualquer fundamento normativo, ora, em total contrariedade ao que determina a legislação nacional vigente.
Outrossim, a confirmar a iniciativa privativa do Executivo a respeito e na forma do art. 100, III e IV da LOM, de forma tecnicamente viável e exequível, a temática compete à Secretaria Municipal de Segurança Pública e Mobilidade Urbana.
Demais disso, o Projeto de Lei nº 5839/2023, interfere na autonomia político-administrativa desta municipalidade, prerrogativa concedida pelo artigo 18 da Constituição Federal e garantida nos artigos 1º e 20 da Lei Orgânica Municipal, ao impor que o Município de Três Corações implante sinalização viária e, como se não bastasse, em desacordo com as normas e parâmetros estabelecidos pelo Conselho Nacional de Trânsito – CONTRAN e ainda, a aplicação de penalidades sem amparo legal.
Ex positis, o Projeto de Lei nº 5839/2023 que “Dispõe sobre o estacionamento de motoboys e regulamenta as respectivas vagas de estacionamento nas áreas urbanas.”, apresenta vício insanável de legalidade, formalidade e inconstitucionalidade formal e material, restando demonstrados os óbices que impedem a sanção do texto do Projeto de Lei nº 5839/2023, pelo o que somos levados a propor o veto em sua totalidade ao citado Projeto de Lei, não podendo o mesmo fazer parte do ordenamento jurídico municipal.
Pelo exposto, é o presente veto total, a fim de apreciação dessa Ilustre Casa Legislativa.
Atenciosamente,
JOSÉ ROBERTO DE PAIVA GOMES
Prefeito de Três Corações – MG