Câmara Municipal de Três Corações - MG

Projeto de Lei Ordinária 5507/2022
de 05/04/2022
Situação
Sancionado / Promulgado (Lei nº 4680/2022)
Trâmite
05/04/2022
Regime
Ordinário
Assunto
AUTORIZA
Autor
Vereador
MAURÍCIO MIGUEL GADBEM.
Documento Oficial Trâmite
Ementa

Autoriza o Poder Executivo a criar órgão de Assistência Judiciária Municipal, gratuita, às pessoas hipossuficientes no âmbito do Município de Três Corações/MG, e dá outras providências

Texto

Art. 1º Fica o Poder Executivo Municipal, com a finalidade de amparar a população carente de Três Corações em seu direito à obtenção de Justiça, autorizado a instituir a Assistência judiciária do Município, subordinada diretamente à Procuradoria Geral do Município, e cujo funcionamento e atribuições serão reguladas pela presente lei e pelos demais dispositivos legais aplicáveis à matéria.

Art. 2º A Assistência Judiciária Municipal é inteiramente gratuita e tem como objetivo proporcionar à população carente de Três Corações atendimento específico no sentido de provê-la de orientação jurídica e dar-lhe condições de postular em Juízo a solução de suas questões judiciais mais prementes.

Art. 3º A Assistência Judiciária Municipal será integrada por advogados em número condizente com a demanda da população carente, beneficiária de seus serviços.

Parágrafo único. Poderão integrar o quadro da Assistência Judiciária Municipal estudantes de Direito que tenham completado o 3º (terceiro) ano do curso, além de Assistentes Sociais, Escreventes, e outros profissionais, se comprovada a necessidade dos seus serviços, para o desempenho de suas finalidades.

Art. 4º A Assistência Judiciária Municipal somente atenderá pessoas, comprovada e reconhecidamente carentes, situação essa que deverá ser certificada pela Secretaria de Desenvolvimento Social/SEDESO, da Prefeitura Municipal, após rigorosa triagem das alegadas condições de penúria do eventual beneficiário do atendimento.

Parágrafo único. Verificando, a qualquer tempo, que o pretendente à assistência não reúne as condições adequadas para tanto, a Assistência Judiciária Municipal deixará de atendê-lo e o encaminhará ao D.D. Ministério Público da Comarca, o qual decidirá sobre a espécie de atendimento a ser dispensado ao mesmo.

Art. 5º A Assistência Judiciária Municipal atuará, prioritariamente, na esfera cível do Direito, voltada, preferencialmente, para as questões de relevante motivação social, atendendo, também, os casos que lhe sejam remetidos pelo D.D. Ministério Público da Comarca e que estejam dentro de sua alçada, desde que, o interessado tenha seu estado de carência reconhecido na forma do artigo anterior.

Art. 6º É vedado a qualquer membro da Assistência Judiciária Municipal a prestação de quaisquer serviços a outros advogados alheios a esta, ainda quando os membros sejam nomeados como "dativos", pelo D.D. Ministério Público da Comarca, para atender a casos e pessoas não enquadrados nos parâmetros estabelecidos nos artigos 4º e 5º da presente Lei.

Art. 7º Os membros da Assistência Judiciária Municipal estão subordinados somente à orientação social e jurídica emanada da Prefeitura Municipal, atuando sempre e somente em objetivos de cunho social e humanitário.

Art. 8º Todos os Membros da Assistência Judiciária Municipal estão sujeitos, no que lhes for aplicável, aos dispositivos legais vigentes sobre a matéria.

Art. 9º É expressamente vedado aos membros da Assistência Judiciária Municipal prestar orientação ou assistência de qualquer espécie a terceiros, em oposição aos direitos e interesses da Municipalidade de Três Corações.

Parágrafo único. Advogados ou estagiários não integrantes da Assistência Judiciária Municipal que, eventual e esporadicamente, estejam prestando sua colaboração profissional à mesma, ficam igualmente sujeitos às restrições convencionadas no caput deste artigo, enquanto perdurar o aludido concurso profissional.

Art. 10. É expressamente vedado aos membros da Assistência Judiciária Municipal  o recebimento de quaisquer honorários, gratificações ou compensações dos assistidos.

§ 1º Ficam igualmente sujeitos às restrições contidas no caput deste artigo, os advogados e estagiários não integrantes da Assistência Judiciária Municipal, quando estejam, prestando sua colaboração profissional à mesma;

§ 2º Os profissionais não integrantes da Assistência Judiciária Municipal, caso queiram prestar à mesma sua colaboração profissional, ficam cientes do compromisso de fazê-lo espontânea e gratuitamente;

§ 3º Quando estejam atendendo profissionalmente, algum beneficiário da Assistência Judiciária Municipal, os profissionais não integrantes da mesma contarão com o concurso dos membros integrantes da Assistência, bem como de todos os meios materiais de que esta disponha, restringida, porém, tal colaboração, aos casos de beneficiário assistido pela Assistência judiciária Municipal, na forma da presente Lei.

Art. 11. A Assistência Judiciária Municipal terá sua atuação preferencialmente destinada a casos de comprovada emergência, bem como poderá atuar para:

I - requerimento de alimentos provisionais ou de pensão alimentícia;

II - investigação de paternidade;

III - suprimento de idade e, em casos especiais a critério da Assistência, suprimento de consentimento;

IV - defesa em procedimentos de despejo e ações possessórias, em casos especiais, quando envolva interesses coletivos, de acordo com o prudente critério da Procuradoria Geral do Município;

V - retificações de assentos e registros civis;

VI - postulação em benefício de réu preso, em casos excepcionais, apreciados sob o ângulo do interesse social e humanitário, resguardando-se sobretudo o aspecto de segurança da população e a critério da Procuradoria Geral do Município;

VII - orientação jurídica e social verbal, dentro dos critérios prescritos na presente Lei;

VIII - constrangimento ilegal ou preconceituoso que venha causar prejuízo à vida profissional ou pessoal da vítima;

IX - outros.

Art. 12. A Assistência Judiciária Municipal, será instalada em local adequado, proporcionado pela Municipalidade, a qual proporcionará, igualmente, todo o material, móveis, equipamentos e utensílios necessários a seu adequado funcionamento.

Art. 13. Toda a documentação comprobatória do estado de pobreza, bem como a destinada à eventual postulação em Juízo, ficarão a exclusivo encargo do pretendente à assistência, sendo vedado à Assistência Judiciária Municipal destinar quaisquer verbas para obtenção de certidões, atestados, registros, documentos (pessoais ou não), cópias reprográficas, alvarás, autorizações, autenticações, selagens, reconhecimento de firmas e outras despesas similares.

Art. 14. Fica o Poder Executivo Municipal autorizado a firmar parcerias e convênios, em especial, com entidades de ensino superior, para o cumprimento do que determina esta Lei.

Art. 15. As despesas decorrentes da aplicação da presente Lei correrão por conta de dotações orçamentárias próprias, suplementadas se necessário.

Art. 16. O Poder Executivo Municipal regulamentará a presente Lei, no que couber, no prazo de 60 (sessenta) dias, a contar da data de sua publicação.

Art. 17. Essa Lei entra em vigor na data de sua publicação, nos termos do art. 174 e § 1º da Lei Orgânica Municipal.

Complemento

Justificativa:

A presente proposição tem por mérito autorizar o Poder Executivo Municipal, com a finalidade de amparar a população carente de Três Corações em seu direito à obtenção de Justiça, a instituir a Assistência judiciária do Município, subordinada diretamente à Procuradoria Geral do Município, e cujo funcionamento e atribuições serão reguladas pela presente lei e pelos demais dispositivos legais aplicáveis à matéria.

Na Constituição da República se impõe ao Estado o dever de prestar "assistência jurídica integral e gratuita aos que comprovarem insuficiência de recursos" (inciso LXXIV do art. 5º). Em recente entendimento do Plenário do Supremo Tribunal federal, em matéria que questionou a constitucionalidade de semelhante legislação da cidade de Diadema/SP, postulou-se que as Defensorias Públicas não têm o monopólio da assistência jurídica a hipossuficientes, e portanto, municípios podem criar serviços de atendimento judiciário a pessoas carentes, de forma a ampliar o acesso à justiça.

A relatora do caso, ministra Carmen Lúcia, afirmou que o Estado tem o dever de garantir assistência judiciária gratuita aos necessitados. E, com isso, ampliar e tornar mais eficiente o acesso à Justiça. A ministra entendeu que este serviço é semelhante ao serviço de assistência jurídica gratuita prestado por escritório de prática jurídica de universidades, e ainda com a advocacia pro bono ou decorrente de parcerias com a OAB para a assistência à população carente.

Acompanhemos trechos do voto da ministra Carmen Lúcia:

O conceito de assistência jurídica é abrangente, compreendendo a assistência judiciária, pela qual o assistido dispõe de meios e pessoal habilitado para ter acesso à jurisdição, e a extrajudicial, que se remete a orientação jurídica e a outros processos que não aqueles formalizados em litígios levados ao Poder Judiciário. (...)

Importa realçar que a competência material para o combate às causas e ao controle das condições dos vulneráveis em razão da pobreza e para a assistência aos desfavorecidos é comum a todos os entes federados, conforme determinado expressamente na Constituição da República:

"Art. 23. É competência comum da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios: [...]

X - combater as causas da pobreza e os fatores de marginalização, promovendo a integração social dos setores desfavorecidos".

Essa competência constitucional comum dos entes federados decorre dos objetivos fundamentais da República previstos no art. 3º da Constituição: construir-se uma sociedade livre, justa e solidária; garantir-se o desenvolvimento nacional; erradicar-se a pobreza e a marginalização; reduzirem-se as desigualdades sociais e regionais; e promover-se o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação.

O acesso à jurisdição, garantia fundamental prevista na Constituição (inc. XXXV do art. 5º), pode ser o meio necessário de que se vale o cidadão para o exercício dos direitos fundamentais. Não é possível que a hipossuficiência econômica constitua obstáculo de acesso ao Poder Judiciário. (...)

Note-se, ademais, que entes até mesmo particulares, como faculdades de direito e seccionais da Ordem dos Advogados do Brasil formulam estruturas e prestam serviços de assistência judiciária, sem jamais ter sido aventada a inconstitucionalidade daquela atuação. Bem ao contrário, o que se tem é atuação que se solidariza na busca de maior e melhor garantia de direitos para os que precisam ter acesso a consultas, assessoramentos e serviços jurídicos.

Também não é proibido – antes, é mesmo estimulado – o serviço advocatício sem cobrança de honorários, especialmente prestados àqueles que não dispõem dos meios para pagar pelos serviços profissionais por um advogado de sua escolha livre.

Como, então, negar ao ente municipal a competência para instituir – sem concorrer, sem fazer oposição e sem afastar o dever da União, dos Estados membros e do Distrito Federal de garantir a eficiência do trabalho da Defensoria Pública – a legitimidade para constituir também órgão que possa somar aos demais na busca de maior efetividade jurídica e social dos direitos dos seus munícipes?

6. De realçar que os Municípios detêm competência para legislar sobre assuntos de interesse local, decorrência do poder de autogoverno e de autoadministração. Cabe à administração municipal ser atento às necessidades da população, organizando e prestando os serviços públicos de interesse local. Confira-se:

"Art. 30. Compete aos Municípios:

I - legislar sobre assuntos de interesse local;

II - suplementar a legislação federal e a estadual no que couber;

[...]

V - organizar e prestar, diretamente ou sob regime de concessão ou permissão, os serviços públicos de interesse local, incluído o de transporte coletivo, que tem caráter essencial".

Insista-se em que a situação posta nos autos assemelha-se àquela em que o serviço de assistência jurídica gratuita aos necessitados é prestado por escritório de prática jurídica pertencente a instituição de ensino superior, cuja finalidade também é a de atender às exigências de estágio obrigatório supervisionado dos discentes, associando-se ensino à extensão.

Na Ação Direta de Inconstitucionalidade n. 3.792, destacou o Relator, Ministro Dias Toffoli (DJe de 1o.8.2017) em seu voto condutor que "não se veda aqui o exercício do serviço de assistência jurídica gratuita aos necessitados pelos escritórios de prática jurídica das instituições de ensino superior, o qual já é de praxe na atualidade, pois, além de atender às exigências de estágio supervisionado, desempenha importante papel social, inclusive concretizando objetivos que as instituições de ensino devem promover, como a indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão e a conscientização dos discentes sobre sua responsabilidade social".

O quadro aqui delineado, portanto, assemelha-se com a advocacia pro bono ou decorrente de parcerias com a Ordem dos Advogados do Brasil para a assistência à população carente.

Assim, em nossa atuação como legisladores de uma causa única, o povo tricordiano, em especial, sua parcela mais carente, devemos estar atentos às diversas demandas que os sobrecarregam ainda mais, e criar soluções legislativas para ampliar sua qualidade de vida e, uma destas soluções seria a de facilitar seu acesso à Justiça, algo que muitas vezes é penoso, burocrático e oneroso.

Por tudo isso, recorro mais uma vez a meus nobres Pares solicitando seu apoio e dedicação para aprovação e aplicação desta Lei.

Usamos cookies e tecnologias semelhantes para melhorar sua experiência neste site.

Ao utilizar nossos serviços, você concorda com esse monitoramento.

Política de privacidade